MADRID 15 set. (EUROPA PRESS) -
Um estudo conduzido por pesquisadores do Conselho Nacional de Pesquisa da Espanha (CSIC) demonstrou que diferentes doenças psiquiátricas, como o transtorno bipolar, bem como hábitos de vida pouco saudáveis, como o consumo de álcool ou drogas, afetam negativamente a capacidade do cérebro humano de gerar novos neurônios saudáveis.
O trabalho, publicado na revista Cell Stem Cell, é o primeiro estudo histológico a demonstrar a existência de células-tronco em divisão no cérebro humano adulto. Essa descoberta confirma que o processo conhecido como neurogênese hipocampal adulta, ou seja, o nascimento de novos neurônios ao longo da vida no hipocampo, uma região cerebral fundamental para a memória e o humor, é um processo real e ativo em humanos.
Em 2021, a equipe liderada por María Llorens-Martín, pesquisadora do Centro de Biología Molecular Severo Ochoa (CBM, CSIC-UAM), descreveu como o cérebro é capaz de gerar novos neurônios a partir de células-tronco graças à existência de um nicho celular especializado presente em pouquíssimas regiões do cérebro, incluindo o hipocampo.
Esse nascimento de novos neurônios dá aos mamíferos uma grande capacidade de adaptação, graças ao que é conhecido como plasticidade cerebral. No entanto, os resultados da equipe de pesquisa indicaram que a neurogênese do hipocampo adulto diminui durante o envelhecimento e que o próprio hipocampo é altamente suscetível a doenças neurodegenerativas.
Agora, o novo estudo do grupo de Llorens-Martín demonstra a vulnerabilidade da neurogênese do hipocampo em relação a determinados distúrbios de saúde mental. Especificamente, a pesquisa revela que a depressão, a esquizofrenia e o transtorno bipolar alteram seletivamente as fases iniciais do processo de neurogênese, impedindo a proliferação adequada de células-tronco e limitando a geração de novos neurônios.
"Nossos resultados mostram que os estágios iniciais e intermediários da neurogênese adulta, bem como diferentes componentes do nicho celular que a sustenta, são particularmente sensíveis a essas doenças, bem como uma vulnerabilidade seletiva de diferentes populações de células a cada uma das doenças estudadas", explica o pesquisador do CBM e líder do estudo.
Esse avanço foi possível graças ao uso de material humano de alta qualidade do Neuropathology Consortium do Stanley Medical Research Institute (EUA) e ao refinamento de técnicas sofisticadas desenvolvidas no laboratório de Llorens-Martín no CBM-CSIC-UAM.
ESTILO DE VIDA, VASOS SANGUÍNEOS E NEUROGÊNESE
O trabalho também revela que fatores demográficos, como idade e sexo, bem como vários hábitos de vida, influenciam a neurogênese adulta, tanto em indivíduos neurologicamente saudáveis quanto em pacientes com doenças psiquiátricas.
Em relação à primeira área, o estudo mostra que algumas das alterações na neurogênese são sistematicamente mais pronunciadas em mulheres do que em homens com várias dessas patologias. "Isso pode ter relevância clínica, dada a maior prevalência de doenças psiquiátricas, como a depressão, em pacientes do sexo feminino", diz Llorens-Martín.
Com relação ao álcool, um dos achados mais relevantes é o efeito diferencial de seu consumo: em pessoas saudáveis, até mesmo o consumo mínimo causa alterações comparáveis àquelas observadas em altos níveis de ingestão; em pacientes com transtornos psiquiátricos, no entanto, observa-se um claro efeito dose-resposta, de modo que quanto maior o consumo, maior o grau de alteração. Finalmente, em relação aos medicamentos, "seu consumo acentua ainda mais as alterações na neurogênese que os pacientes com doenças psiquiátricas apresentam", acrescenta o pesquisador.
Outro dos resultados significativos do estudo é a relação entre o estado dos vasos sanguíneos do hipocampo e a capacidade de gerar novos neurônios. A gravidade e a duração da doença psiquiátrica se correlacionam com as alterações vasculares nessa região, o que aponta para a importância do nicho neurogênico (o microambiente especializado onde nascem os neurônios) na plasticidade cerebral e a vulnerabilidade do cérebro humano a essas patologias. Os dados sugerem que, quanto maior a duração dessas doenças, mais o nicho neurogênico é progressivamente (ou cumulativamente) danificado, o que tem um impacto ainda mais negativo sobre o processo de neurogênese.
FUTURAS TERAPIAS PARA TRATAR TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS
"Essa estrutura integrativa, que combina aspectos clínicos, fatores demográficos e sociais, nos permite avançar em direção a uma compreensão mais profunda da regulação multifatorial do processo de neurogênese adulta em humanos", diz Llorens-Martín.
"Embora ainda seja necessário determinar se essas alterações são uma causa ou uma consequência de doenças psiquiátricas, nossos dados podem estabelecer as bases para o projeto de futuras estratégias terapêuticas destinadas a restaurar a neuroplasticidade cerebral nesses distúrbios, bem como prevenir essas patologias", acrescentou Llorens-Martín.
Considerando o papel fundamental que o nascimento de novos neurônios no hipocampo tem em funções como memória, aprendizado e regulação do humor, esse estudo destaca tanto a relevância biológica quanto o desafio clínico de estudar esse processo em seres humanos. Ele também destaca a excepcional dificuldade de acesso a amostras cerebrais de alta qualidade, que são essenciais para o avanço de nossa compreensão da saúde mental.
A pesquisa, liderada pelo CSIC, teve a participação da Universidad Autónoma de Madrid (UAM) e do Centro de Investigación Biomédica en Red (CIBERNED); e com financiamento do Conselho Europeu de Pesquisa (ERC Consolidator Grant), do Ministério da Ciência, Inovação e Universidades, da BrightFocus Foundation, do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia do Governo do México e da Secretaria de Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo da Cidade do México.
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